Algumas exigências, em termos de vocabulário, podem complementar os critérios fundamentados nos princípios e valores da liderança, tão amplamente comentados nessa série de artigos publicados em minha coluna. Essas observações não são prioritárias, – diria, até, bastante esquecidas – no cômputo geral dos manuais que tratam da matéria. Nem sempre, porém, deixam de chamar a atenção dos liderados mais atentos e, conforme o momento, desmerecem a exposição do líder. Falo aqui, bem entendido, dos líderes que se ocupam da administração/gestão de suas instituições, onde há um nível mais elevado de compreensão e cultura. O que vou dizer não cabe para as lideranças populistas, em circunstâncias político-eleitorais, em que o sentido das palavras não obedece ou nem se coaduna com os propósitos do discurso.
Refiro-me a duas vertentes. Na primeira delas, falarei sobre os principais erros (ou equívocos) de linguagem, que confundem ou chocam os ouvintes mais esclarecidos. Tal poderia estar incluído no capítulo de clareza na linguagem (e não de lições gramaticais). Exemplifico com os mais comuns. É bastante frequente que no decorrer de um discurso, palestra ou explanação, o orador, ao querer referir-se a alguma manifestação de concordância, exemplifique dizendo: a sugestão que você propôs vem exatamente de encontro às metas do nosso planejamento estratégico. Ele quis dizer: a sugestão está de acordo, complementa, acresce no planejamento. E ele disse o contrário: de encontro é contra (exemplo: o carro foi de encontro ao paredão). Ele deveria ter dito: sua sugestão vem ao encontro, está de acordo, favorece as metas do nosso planejamento. Aos ouvintes esclarecidos, isso choca, desmerece, retira alguns pontos na qualidade expositiva do líder.
Outra expressão habitual e repetitiva nas alocuções é o a nível de, que provoca arrepios e alguns constrangimentos aos ouvintes. Todos os gramáticos recomendam que se fuja dela. Troque-a por outra oração que possa atingir o mesmo significado (no que se refere, por exemplo). Dependendo do que pretende-se dizer, poderia usar o ao nível de quando se trata de estar à mesma altura, como: a cidade tal está ao nível do mar.
Mais uma: ao começar sua saudação, numa plateia lotada, o falante diz: Bom dia a todos e a todas. Ai!!! Já me deixou mal! Todos quantifica as pessoas de ambos os sexos: homens, mulheres, crianças, velhos, gays e demais. Portanto, é redundante o uso em dois gêneros gramaticais. Também acresceria que nem o Bom dia a todos é necessário, pois que, quando o anunciado palestrante se apresenta à plateia, ele obviamente não pretende saudar somente uma parcela de pessoas. Existem múltiplas outras formas mais adequadas de saudação inicial dependendo do público que compõe o plenário.
A outra vertente trata do que passei a denominar “palavras gastas”, das quais o líder deve fugir, não repeti-las só porque estão na moda. Costumo deixar à margem repetições de termos ou frases que são utilizadas em demasia na mídia escrita, falada ou televisionada. Isto, em geral, ocorre pelo modismo. São palavras que, de tanto serem ditas e repetidas, vão gastando, e acabam perdendo o sentido e a força que deveriam imprimir – como pá que lavra para abrir os caminhos do convencimento. Fui buscar esse termo na poesia do português Eugénio de Andrade (1923-2005): “Já gastamos as palavras. Quando agora digo: meu amor… já não se passa absolutamente nada. Também Ferreira Gullar (1930-2016) transitou nesse rumo em Poema Sujo.
O uso, por demais repetido, principalmente nos discursos de parlamentares de todos os níveis, de estado democrático de direito, faz com que essa expressão, acabe por tornar-se corriqueira e sem a vitalidade que mereceria. Para disrupção e disruptivo, na modernidade tecnológica, então, nem preciso tecer comentários. E por aí afora vamos indo: paradigma, alinhamento, muito articulado, insight, e o enfadonho veja bem!.
Palavras gastas. Relembrem Malvina Cruela. Fujam dela!
Sejam um pouco mais criativos!