As bases doutrinárias que embasaram a criação das cooperativas médicas no Brasil foram as mesmas que alicerçaram os outros ramos do cooperativismo universal. Os princípios, hoje, consagrados, foram organizados muito além dos tempos dos Probos Pioneiros de Rochdale pela Aliança Cooperativa Internacional (ACI). Quando os médicos, também pioneiros de Santos, no ano de 1967, comandados por Edmundo Castilho, fundaram a primeira cooperativa médica no país, utilizaram o raciocínio cooperativista com o propósito de buscar melhores condições de trabalho e remuneração para os sócios (profissionais cooperados), pelo esforço conjunto na unidade de princípios, estavam lastreados na assertiva de cada homem, um voto.
Somente quatro anos mais tarde, em 1971, foi aprovada a Lei 5.764 no Brasil, que perdura até hoje, em alguns tópicos ultrapassada. E assim se fez, e assim progredimos, muito além das expectativas previstas naqueles primeiros anos e das dificuldades para explicar como os médicos, classe privilegiada, ousavam unir-se em sociedades cooperativas tipo urbanas, quando as conhecidas tradicionalmente, até então, eram as cooperativas rurícolas, de trigo, soja, milho, mormente no interior do Rio Grande do Sul. Sempre uma sociedade de pessoas, não de capital.
Quase todos nós – naquela década – tínhamos origem política no associativismo, na luta pelas melhorias de condição de trabalho médico. Alguns no sindicalismo. Por isso, adotar uma nova fórmula de solução para o impasse estatização versus privatização na assistência médica, que ocupava o cenário dos debates nas entidades da categoria, era, ao menos, instigante. Esse tal de cooperativismo viria ocupar o meio da linha estendida entre aqueles dois extremos. Alguns acreditaram por fé, já que nada de similar existia para comprovar o resultado. Outros permaneceram na quietude da dúvida, eximindo-se de opinar.
Mesmo com as dificuldades iniciais em convencer os médicos a integrarem-se à uma nova causa, o Sistema Unimed, no decorrer das décadas seguintes, progrediu a largos passos, tornando-se verdadeiramente nacional, quando da criação da Confederação Unimed – Unimed do Brasil (cooperativa de terceiro grau) e, por necessidade de competição no mercado, das empresas coligadas (como costumo chamar) ou auxiliares. E hoje, na pós-modernidade, temos aí uma plêiade de instituições societárias, algumas cooperativas, outras empresas de capital. E as administrações passaram a diferenciar-se conforme a legislação de cada unidade: ou pela Lei Cooperativa, ou pela Lei das Sociedades Anônimas.
Neste cenário polimórfico e diversificado vivíamos de certa maneira bastante confortáveis, sob os olhares atentos e plenipotenciários da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), criada no decorrer de nossa maturidade, transformando-nos em operadoras de Planos de Saúde. Na equivalência total e absoluta com todas as demais que, até aquela data, considerávamos exploradoras do trabalho médico. Hoje, somente somos Cooperativas de Saúde, um dos ramos reconhecidos pelas Organizações Cooperativas Estaduais (OCEs) ou pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB). Para a legislação em vigor e decisões emanadas sob forma de Normas Derivadas (NDs), somos Operadoras de Planos de Saúde.
Como vencer as dificuldades que, por vezes, antepõem a doutrina (Lei 5.764) com a Lei 9.656 dos Planos de Saúde? Como equalizar as exigências do mercado, que espera rapidez de decisões, competitividade de preços, novos sistemas tecnológicos inovadores, com a democracia cooperativista, basicamente alicerçada no poder assemblear do cooperado, finalidade precípua de sua criação?
Desses temas estaremos tratando a partir da nova série, uma vez encerrada as Lições para uma Liderança Duradoura.
Acompanhem-nos.