A falta de perspectiva para o fim da pandemia após mais de um ano, quase 400 mil mortes evitáveis, vacinação em ritmo lento e o medo do contágio ou desemprego são alguns dos fatores que preocupam os brasileiros e podem afetar a saúde mental das pessoas.
O levantamento realizado pelo Instituto Ipsus, a pedido do Fórum Econômico Mundial, aponta que 53% dos brasileiros declararam que a sua saúde mental piorou muito ou pouco com a pandemia da Covid-19. O resultado coloca o Brasil em segundo lugar no ranking de países em que o bem-estar mental se deteriorou em um ano. A situação é crítica também na Turquia (61%), Hungria (56%), Chile (56%) e Itália (54%).
“Sem dúvida a Covid-19 está elevando os níveis de ansiedade das pessoas e provocando quadros de depressão. Famílias estão em luto e, mesmo quem não passou por perdas, está sendo confrontado com a morte diariamente, ou seja, cotidianamente somos lembrados da nossa fragilidade e vulnerabilidade, o que gera uma sensação de angústia muito grande. Outro aspecto, também decorrente da pandemia, é a crise econômica grave que temos enfrentado, há uma onda de desempregos, reduções salariais e tensões no ar, contribuindo para a instabilidade emocional”, afirma Gabriela Azevedo, psicóloga e coordenadora da Academia de Talentos do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT).
Coronavírus afetou a saúde mental dos trabalhadores
Um estudo preliminar coordenado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e realizado em parceria com outras instituições, mostrou que a ansiedade e depressão atingiram 47,3% dos trabalhadores de serviços essenciais durante a pandemia, no Brasil e na Espanha.
A pesquisa também identificou que 44,3% dos trabalhadores têm abusado de bebidas alcoólicas; 42,9% sofreram alterações no sono e 30,9% foram diagnosticados ou já se trataram de doenças mentais em 2019.
O artigo intitulado Depressão e Ansiedade entre trabalhadores essenciais do Brasil e da Espanha durante a Pandemia de Covid-19 foi publicado no Journal of Medical Internet Research.
Os efeitos da pandemia de Covid-19 na saúde mental resultaram em um aumento no número de afastamentos do trabalho. De acordo com dados da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, 2020 bateu recorde em concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez devido aos transtornos mentais e comportamentais. Foram 576,6 mil afastamentos, um crescimento de 26% em relação ao registrado em 2019.
A ansiedade e depressão registraram a maior alta entre as doenças indicadas para solicitar o auxílio-doença. A concessão do benefício aumentou 33, 7%, passando de 213,2 mil, em 2019, para 285,2 mil, em 2020.
A saúde mental dos trabalhadores é um tema essencial e que vem ganhando espaço a cada ano, inclusive no Fórum Econômico Mundial. “Passamos praticamente 1/3 do nosso tempo trabalhando. E se o ambiente de trabalho ocupa boa parte de nossa vida, isso torna as empresas corresponsáveis pelo bem-estar e saúde de seus colaboradores. A pandemia apenas acelerou o processo de valorização de um aspecto que é central no bem-estar das pessoas”, diz Luciene Bandeira, psicóloga e diretora na plataforma Psicologia Viva.
Andrea Deis, mestre em gestão empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), defende que os gestores devem se adequar, ganhar competência para lidar com o ambiente que a pandemia criou e com as pessoas que vivem um momento de exaustão.
“Mente sã garante eficiência e bons resultados. Ninguém oferece o que não tem e os trabalhadores com saúde mental boa ficam mais criativos, resolvem os problemas e, muitas vezes, alcançam melhores resultados com menor esforço. Essas pessoas são fontes geradoras de resultados, então a partir do momento que o gestor pressiona, mantém o monitoramento e a cobrança como era anteriormente sem o caos da pandemia, esses líderes estão inadequados”, alerta.
Como cuidar da saúde mental dos funcionários das clínicas e consultórios
O medo da contaminação é uma sensação constante para os trabalhadores de serviços essenciais, como médicos, enfermeiras, segurança, recepcionista, encarregada da limpeza e demais funcionários que mantêm clínicas, consultórios e hospitais funcionando.
As medidas de proteção que incluem o uso de máscaras pff2, ventilação do espaço físico, distanciamento entre as pessoas e maior intervalo entre as consultas médicas geram segurança, mas também é necessário olhar com atenção para a saúde mental do funcionário.
“Não podemos esquecer que são seres humanos, que têm fragilidades e sentimentos. Todos nós estamos expostos à pandemia, mas os profissionais de serviços essenciais estão mais expostos. Disponibilizar para eles recursos para cuidarem de sua saúde é fundamental. Isso inclui assistência médica e psicológica, mas também jornadas de trabalho que permitam descanso, folgas, espaços para descompressão, campanhas de conscientização e incentivo ao autocuidado e que vão além de apenas um discurso, mas que implementem ações reais de cuidado e promoção de bem-estar para os colaboradores”, afirma Bandeira.
O cuidado com a saúde mental do funcionário começa a partir do momento que o gestor mostra que se importa, segundo Azevedo. A psicóloga e coordenadora do IMT, orienta que os gestores perguntem e demonstrem interesse genuíno em ouvir como o seu colaborador está.
“Queira saber como estão seus familiares e reconheça os sentimentos que ele compartilhar. A situação é preocupante, angustiante e a rotina pode estar cansativa. São todos sentimentos legítimos, por isso, valide e apoie. Lembre-o de que não está sozinho”, recomenda.
Outro aspecto importante, de acordo com a especialista, é observar o comportamento do funcionário. “Preste atenção na concentração de seu funcionário, perceba se ele está mais disperso e distraído com maior frequência. Fique atento também ao humor, procure entender se ele está mais irritadiço, calado ou até mesmo mais falante do que o usual. As alterações nos padrões de comportamento também são indícios de que seu funcionário pode não estar bem. Não hesite em oferecer ajuda”, finaliza.
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