O Programa Nacional de Imunizações (PNI), do Ministério da Saúde, por muito tempo foi referência para outros países por sua amplitude e eficácia, oferecendo 27 tipos de vacinas gratuitamente para a população por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). Agora, no entanto, foram reacendidos debates que há muito pareciam não precisar serem recobrados.
Isso porque, segundo dados dessas instituições, pela primeira vez em 16 anos, o índice de cobertura vacinal no Brasil, que estava em queda há alguns anos, foi o mais baixo já registrado. Com esse fenômeno recente e perigoso, o risco do retorno de doenças até então consideradas erradicadas, aumenta.
A preocupação se amplia quando dados do Ministério da Saúde mostram que, do total de crianças com até 5 anos, apenas 73% foram vacinadas contra a gripe. A meta era de 90%. Ou ainda, quando um levantamento do PNI revela que 94% dos municípios brasileiros têm ao menos uma vacina abaixo das metas estabelecidas e que 63% deles têm pelo menos cinco com cobertura abaixo da ideal.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) calcula que a redução do número de mortes por conta de imunização chega de dois a três milhões a cada ano. Apesar disso, há fatores que influenciam negativamente a opinião pública quando se fala em vacinação, sendo que notícias falsas (conhecidas também como Fake News), teorias da conspiração e desinformação são os principais.

O principal questionamento é como reverter essa situação e, ainda mais, como convencer os pais da importância – individual, mas principalmente coletiva – de vacinar seus filhos. O médico pediatra e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Renato Kfouri, dá dicas de como responder da melhor maneira aos questionamentos e inquietações em relação à vacinação:
Como saber se as vacinas são seguras?
RK: Todo produto, seja ele uma vacina ou um remédio de venda livre, passa por inúmeras fases de estudos, que envolvem milhares de testes e estudos diferentes – não só em relação à segurança, mas também a eficácia – antes de seu licenciamento. Quando um produto chega ao mercado, já é comprovado que ele tem resposta imune (em outras palavras, os anticorpos estão presentes), é eficaz (ou seja, para quem foi imunizado, há diminuição no risco de adoecimento) e seguro (os efeitos colaterais previstos, como em qualquer remédio, são toleráveis e menos importantes que as doenças as quais estão prevenindo).
É realmente importante se vacinar?
RK: Vacinas salvam vidas. Antes, nossa expectativa de vida era muito baixa. Agora, as pessoas vivem até 80 anos dependendo do país e da região, muito graças aos programas de imunização, que levaram à erradicação, controle ou minimização de doenças infecciosas. Elas revolucionaram a medicina e trouxeram novas perspectivas para a sociedade como um todo, mudando o índice de mortalidade ligado a essas patologias – que, hoje, responde por menos de 10% das mortes que acontecem no planeta.
Por que o número de imunizações vem caindo nos últimos anos?
RK: Uma das principais causas, na minha opinião, para essa baixa vacinal é o fato de as vacinas, por erradicarem e controlarem algumas doenças, fazerem com que a própria percepção de risco se perca. As pessoas eram muito preocupadas em se imunizar no passado porque conheciam pessoas que faleceram ou ficaram muito debilitadas por conta de doenças infecciosas. Havia um receio muito grande e essas patologias faziam parte do dia a dia das pessoas. A cultura de vacinação, prevenção e proteção de uma sociedade – não só no Brasil, como no mundo todo – é muito baseada nessa percepção de risco. Se não me sinto ameaçado, minha disposição de procurar imunização reduz. Não só entre a população, mas entre os profissionais da saúde também. Alguns médicos da nova geração não vivenciaram essas doenças e provavelmente nunca trataram alguém com essas condições.
Por isso, são profissionais pouco sensibilizados com a urgência da vacinação, que recomendam a imunização com menos veemência e cobram de maneira menos enfática de seus pacientes o cartão vacinal. Claro, há outros fatores que diminuem a vacinação, como falta de vacina nos postos de saúde ou as Fake News. Ainda assim, enquanto existirem essas doenças, mesmo que com número de casos muito diminuídos, a imunização precisa continuar para não corrermos o risco de presenciar a reincidência de algumas delas, como o sarampo, que já foi considerado erradicado do país pela OMS, mas teve novos casos neste ano.