Uma das publicações científicas de maior prestígio, a The Lancet, afirmou em editorial de junho “ser preciso encontrar maneiras de usar a ciência como um instrumento de mudança social.” Pouco antes do calor dos protestos contra a morte do norte-americano George Floyd, que ganharam repercussão global, o BMJ (British Medical Journal) havia publicado um estudo que apontava a omissão das escolas de medicina inglesas em casos de preconceito contra minorias étnicas.
Iniciativas como as dos dois veículos, entre outras, sinalizam que começa a ganhar força um movimento antirracismo no segmento da saúde.
No Brasil, não há divulgação de pesquisas que revelem a representatividade de estudantes negros nas universidades de medicina. Mas, de acordo com um levantamento feito pelo Conselho Regional de Medicina (Cremesp), apenas 0,9% de 3 mil médicos formados em 2014 no Estado de São Paulo eram negros.
Na tentativa de promover mudanças nesse panorama, o Instituto Luiza Mahin (ILUMA) lançou, no início do ano, um projeto de apoio a estudantes negros. “O objetivo é fornecer orientação acadêmica, profissional e auxílio financeiro para o acesso e manutenção dos jovens na faculdade”, explica a ginecologista Andrea Gonçalves, que está à frente da comunicação da organização

O ILUMA é a primeira associação de médicos negros do Brasil. “Não temos ideia de separatismo. A luta antirracista não é apenas de pessoas negras, mas de todos que desejam uma sociedade mais justa”, afirma a médica.
Nos Estados Unidos, a associação White Coats 4 Black Lives (WC4BL), criada por estudantes de medicina em 2014, também se engaja em ações antirracistas no âmbito da saúde. A organização é chamada de voz do movimento Black Lives Matter na medicina.
Foi em Nova York que uma massa de jalecos brancos, máscaras e roupas cirúrgicas tomou as ruas de Nova York e engrossou os protestos de maio e junho, a maior manifestação civil nos Estados Unidos desde os anos 1960. Desta vez, eram médicos e enfermeiros, considerados heróis na batalha contra a COVID-19, que saíram dos hospitais para denunciar a segregação racial no sistema de saúde público.
Tal qual a organização WC4BL, a brasileira ILUMA abrange em seu escopo a busca por melhorias na assistência à saúde dos pacientes. “Mais de 80% de usuários do SUS são negros. Nosso objetivo é formar bons médicos e oferecer mais qualidade na saúde”, afirma Andrea.
Diversos outros grupos se mobilizam no país. Entre eles, o Coletivo Negrex, que surgiu com estudantes de medicina de Belo Horizonte, em 2015. Na pauta em comum está a necessidade de criar oportunidades para todos. “O serviço médico, como qualquer outro, funciona melhor quando há diversidade”, enfatiza a ginecologista.

















