Prahlad, um estudioso das questões da gestão, dizia que o maior inimigo do sucesso de amanhã é o sucesso de hoje! Com isso, queria dizer que a inovação deve ser uma constante na vida das organizações que querem fazer parte de seu tempo. A inovação faz parte da forma como as contínuas transformações ambientais e internas nas organizações devem ser enfrentadas.
Nesses tempos, um dos fenômenos mais complexos que as organizações de saúde tem enfrentado é, sem dúvida, o da judicialização. E ele é fruto, entre outras possibilidades, do desejo de ter acesso a algo mal compreendido do qual se teve conhecimento. Aqui, o que ocorre tem a ver com o que Foucalt definiu como sendo medicalização, ou seja, confundir o consumo de bens e serviços de saúde com saúde. No caso do cidadão que se depara com o novo produto ou serviço o resultado é medicalização – querer ter acesso a algo que se acredita que pode fazer bem.
Mas também os profissionais de saúde podem ser medicalizantes – um médico que manda para a UTI um paciente fora de possibilidades terapêuticas, ou que receita um medicamento off label (prescrever um medicamento com uma indicação não aprovada em sua bula), ou ainda que prescreve uma droga que está em fase experimental, na melhor das hipóteses, é medicalizante. Na pior, pode ter a ver com desonestidade.
É importante entender essas diversas faces do consumo de tecnologia, pois ela pode ser movida pela ignorância ou pela ganância. Ignorância é medicalização, ganancia é crime. Existem muitos episódios envolvendo médicos, advogados e/ou indústrias que tipificam esse tipo de crime.
Em qualquer das duas situações, o judiciário pode ser acionado e aí se instaura uma nova situação com um terceiro agente movido por uma outra força dentro de uma sociedade democrática e que busca restabelecer direitos. Ou seja, é uma ação muito positiva.
Este fenômeno tem movimentado cerca de R$ 7 bilhões ao ano no país! Quais as alternativas para melhorar este jogo? Creio que se deve agir em duas frentes – uma é nas organizações de saúde, e outra é no Judiciário. Mas são ações basicamente semelhantes – buscam injetar conhecimento na equação acima formulada.
Do lado das organizações, trata-se de construir um processo inteligente de incorporar tecnologia utilizando o conhecimento disponível sobre essa tecnologia. O uso da Medicina Baseada em Evidências, por exemplo. Construir protocolos, núcleos de avaliação de tecnologia, etc. Trata-se de ter um papel ativo no processo de incorporar tecnologia e no contato com o Judiciário levando conhecimentos relevantes para a decisão do juiz.
Mas também exige que o Judiciário tome medidas para mediar esse conflito. Nesse sentido, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, aprovou uma série de medidas que estão sendo colocadas em prática e já começam a demonstrar seus efeitos. Basicamente, implicam em criar junto aos Tribunais de alçada uma vara especializada em saúde com juízes que terão uma melhor condição de analisar e entender estas questões, principalmente apoiados pela segunda medida que envolve a criação, junto a estes tribunais, de Núcleos de Avaliação de Tecnologia em Saúde – NATS/JUS. Assim, o magistrado poderá apoiar sua decisão no conhecimento que lhe será disponibilizado e que será incorporado a um banco de dados nacional com estes documentos produzidos por ocasião da decisão do juiz.
Este conjunto de movimentos deve melhorar a judicialização como instrumento de recompor direitos em um tempo que tanta tecnologia está continuamente sendo colocada à disposição da sociedade. E envolverá uma nova disposição do Judiciário não só de tomar melhores decisões, mas também desmascarar movimentos criminosos que com frequência ficam na sombra.
No entanto, será fundamental que as organizações de saúde tenham um comportamento mais proativo na disponibilização de dados e conhecimentos que potencializem essa disposição do judiciário de trabalhar à luz das evidências e do melhor conhecimento.