O resultado do controle de preços de medicamentos no Brasil teve e continua tendo consequências muito positivas no processo de atenção médica no país. Existem muitos artigos e dados já publicados sobre as evidências desse controle pela Anvisa. A CMED – Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos – que iniciou sua operação em 2001 como CAMED e foi reformulada em 2003, vem produzindo notáveis resultados no controle de preços de entrada e sua evolução no mercado brasileiro.
Essa atividade que às vezes é vista como sendo ultrapassada, afinal o mercado é que deve ter esse papel, dizem alguns ilusionistas liberais, é feita em todos os países desenvolvidos, exceto nos USA. Existem nuances que diferenciam a sua ação, como somente controlar preços de produtos que ainda tem proteção de patentes, ou esses e os produtos que tem uma posição dominante no mercado pelo valor de sua marca.
No Brasil, fez-se um compilado das experiências desses países para construir sua proposta de controle. Existe um controle bastante amplo sobre os preços e o sucesso é bastante demonstrável, quando se compara preços de diversos medicamentos com outros países mais desenvolvidos e mesmo com países da América Latina.
E a evolução dos preços também tem sido mais vagarosa. E não teve efeitos colaterais como as grandes indústrias gostam de dizer – o controle de preços nos levará a não ofertar nossos produtos em um mercado onde eles sejam regulados. O tamanho do mercado brasileiro é muito atraente para que esse tipo de comportamento ocorra.
Os medicamentos que faltam aqui são aqueles utilizados para tratar de “doenças de pobre”. Ou aqueles que têm pouca demanda e preço baixo. Falta penicilina, mas não faltam anticorpos monoclonais.
A combinação do controle de preços com uma política pública de estimulação para a produção de cópias – inicialmente com os genéricos, que para entrar no mercado deveriam ter o preço 40% inferior ao produto de referência – criou uma oferta de produtos com qualidade e com preços cada vez mais competitivos.
Regulação de preços e regulação das condições de produção transformaram o mercado brasileiro nos anos 2000. E a partir de 2008, se desenvolveu uma política mais agressiva de induzir a produção de cópias de produtos mais complexos.
Produtos do campo da biotecnologia, cuja cópia é muito mais complexa e os testes para demonstrar sua similaridade são feitos por meio de estudos clínicos e tem necessidade de altos investimentos, passaram a ser induzidos pelo Ministério da Saúde, por meio de um programa chamado de Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP).
Esse programa federal estimula que um produtor nacional desenvolva um similar e o MS garante durante um período de 5 anos a compra sem licitação a um preço mais baixo que o produto existente no mercado.
As PDPs permitem que o MS compre a preços no mínimo 40% abaixo do preço original de mercado – hoje são comprados produtos como Etanercepte, hormônio do crescimento, Trastuzumabe e antirretrovirais dessa maneira. Com esse crescimento, foram desenvolvidas mais de 80 PDPs, que neste momento estão com a velocidade diminuída. Tudo está parado neste governo. E o controle de preços também está claudicando. O ministro da economia quer transferir a CMED da Anvisa para a Economia.
A pergunta é: por que? O controle de preços tem produzido excelentes resultados estando na área da saúde. E mais ainda estando onde os registros são concedidos. Por que os levar ao ministério que nega o valor do controle de preços? A que interesses se está buscando atender?
O caminho a ser trilhado seria o contrário, o de expandir as PDPs e continuar impondo um rígido controle dos preços de entrada de medicamentos no mercado. A esses instrumentos, devemos adicionar o seu uso mais criterioso, sempre apoiado na medicina baseada em evidências e não em charlatanismos como os observados com o kit covid.
Mas se o medicamento é um dos capítulos custosos e que precisam ser discutidos, muito mais complexos são os capítulos seguintes: compra de produtos para saúde; próteses; órteses e materiais especiais, e equipamentos médicos. Esses serão assuntos dos próximos artigos.
Por hora, é importante que nos apropriemos do que pode acontecer com os medicamentos e, ao fazê-lo, tratarmos de nos posicionar para que o estrago que possa ser evitado. Temos que nos manifestar e deixar clara nossa posição contra a saída da CMED da Anvisa e a importância de reforçar as PDPs.