Mundialmente, o desafio é conter o surto de Covid-19, salvar vidas e mitigar
seus impactos econômicos. O efeito da Covid-19 sobre a atividade econômica será profundo. Enquanto a vacina e/ou remédio não surgem, a solução para a crise sanitária atual é o distanciamento social, diferente das crises sanitárias anteriores. É necessário conter a evolução do número de pessoas infectadas pela Covid-19 e
adequá-la à capacidade de atendimento do sistema de saúde de cada país.
A adoção do distanciamento social tem custo econômico porque, (i) no primeiro momento acarreta redução da demanda agregada que, por sua vez, resulta em contração do crescimento das economias e, consequentemente, do comércio mundial; (ii) no segundo momento – de volta à normalidade – a retomada das atividades deve ocorrer de forma bastante gradual, sob o risco de uma segunda onda de infectados, devido à baixa imunização da população. O caso de uma segunda onda, só elevaria o custo deste surto em termos de vidas e econômico, pois levaria há um novo distanciamento social. Assim, os efeitos desta crise sanitária sobre o comércio mundial e a demanda doméstica serão muito significativos.
Para mitigar os efeitos da Covid-19 sobre a economia, que se assemelha ao impacto destruidor de guerra, o receituário da política econômica é a expansão da política fiscal e monetária, buscando mitigar a destruição de capital humano e de capacidade instalada e viabilizar a retomada econômica no pós-crise. Até agora, entre
medidas monetárias e medidas fiscais, as economias avançadas anunciaram em torno de US$ 11,5 trilhões, 53% deste total em medidas fiscais e 47% em medidas monetárias. Medidas monetárias focadas na liquidez e manutenção da funcionalidade dos mercados e medidas fiscais focadas em transferências de renda para famílias e empresas. Os pacotes monetário e fiscal nos Estados Unidos, totalizam 12% do PIB, os pacotes na Alemanha somam 26% do PIB e no Japão, 20% do PIB. Já no Brasil, o espaço para expansão fiscal é limitado. Mesmo assim, a injeção de recursos novos na economia totalizam quase 5% do PIB. Neste ambiente de restrição de recursos
faz-se mais necessário a eficiência na alocação dos mesmos. Por enquanto, as medidas fiscais endereçaram a transferência de renda para as famílias e empresas (via redução ou postergação de impostos e linhas de crédito), gastos com saúde e auxílio financeiro para os estados e municípios (para ajudar na prestação dos serviços
de saúde, abastecimento e segurança). Contudo, é necessário que os gastos permaneçam nesta direção, que sejam feitos com transparência e sejam definidos como temporários, ou seja, não comprometam os resultados fiscais dos próximos anos. Pois, passada a pandemia, a confiança que o Brasil retomará a agenda de consolidação fiscal é um dos pilares para a recuperação econômica e para a estabilidade dos preços. Somente em um ambiente de estabilidade de preços, os investimentos, tão necessários para a recuperação econômica, retornarão.
O que se pode esperar? O Brasil, igual o resto do mundo, sofrerá contração das exportações líquidas e da demanda doméstica no primeiro semestre. Por exemplo, as expectativas de contração da economia brasileira neste ano gravitam entre 3% a 8%. E, ao contrário das economias avançadas, a velocidade da recuperação econômica brasileira deve ser mais lenta, devido às diferenças de ponto de partida. As economias avançadas encontravam-se em momento de crescimento econômico pujante ou com início de desaceleração suave e com situação fiscal consolidadas. Já o Brasil, encontrava-se ainda em recuperação lenta devido à recessão do período 2015-2016 e em esgotamento fiscal.
Além disso, se todos os pilares forem mantidos: comprometimento com consolidação fiscal, política monetária focada em manter a estabilidade de preços e regime de câmbio flutuante, pode-se esperar também, que o efeito da Covid-19 seja deflacionário, devido à contração da demanda. E, assim, continuarmos num ambiente de taxa de juros baixa por tempo prolongado, por motivos estruturais externos e domésticos. Existe o espaço para a contínua redução da taxa Selic e deve ser usado pela autoridade monetária. Em tempo, também podemos esperar que o final do segundo semestre traga um momentum diferente para a economia brasileira; com expansão tanto da demanda doméstica quanto das exportações líquidas.
Para isto será crucial a manutenção dos pilares macroeconômicos citados, reequilíbrio institucional e coordenação política entre os três poderes. O cenário ainda é de alta volatilidade e a maneira que será administrada a saída da tormenta, pode fazer prevalecer os efeitos positivos da maior liquidez internacional frente à aversão ao risco gerada pela elevada incerteza no curto prazo.
Por Tatiana Pinheiro,
Economista-chefe do BNP Paribas Asset Management Brasil.