A atividade mundial permaneceu na trajetória de recuperação em setembro, e as bases para a continuidade da expansão econômica estão presentes. A necessidade de recontratação de parte dos trabalhadores dispensados durante o auge da crise e o crescimento do mercado de crédito sustentarão o consumo e a produção nos próximos trimestres.
Nos EUA, as vendas de varejo já superaram o patamar anterior da crise e impulsionam a produção. Assim, as empresas americanas já recontrataram metade dos trabalhadores demitidos na crise, e os indicadores antecedentes sugerem a continuidade da recuperação do emprego, como o elevado nível de encomendas e o alto patamar de produto por trabalhador (Figura 1).
A expansão da massa salarial e do crédito deve suportar o consumo das famílias e, consequentemente, impulsionar o PIB real em 5% em 2021.
Figura 1. EUA: Produto por trabalhador antecipa aumento do emprego.
Fonte: Eduardo Yuki
No Brasil, a atividade econômica também continua em forte recuperação. As vendas de varejo superam o volume anterior da crise em agosto, como mostra a Figura 2.
Figura 2. Brasil: Vendas de varejo acima do patamar anterior da crise.
Fonte: IBGE. Elaboração: Eduardo Yuki
Essa recuperação do consumo está beneficiando a produção industrial, o que levou o nível de utilização da capacidade instalada da indústria para o maior patamar desde março de 2015.
A retomada da produção nacional tem incentivado a contratação de novos trabalhadores. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostraram a criação de 110 mil e 164 mil vagas de emprego com carteira assinada em julho e agosto, com ajuste sazonal.
Apesar dessa recuperação incipiente do mercado de trabalho, o produto por trabalhador subiu fortemente no trimestre passado, o que indica a necessidade de expansão do emprego para fazer frente à retomada da produção.
Figura 3. Brasil: Retomada da produção antecipa a recuperação do emprego.
Fonte: Eduardo Yuki
Além disso, a baixa taxa de juros e as medidas de liquidez implementadas pelo Banco Central começaram a impulsionar a concessão de crédito para pessoa física.
Assim, a recuperação da massa salarial e do crédito sustentarão o consumo das famílias nos próximos trimestres. Isso será suficiente para expandir o PIB real em 4% em 2021.
A recente aceleração da inflação é resultado de alguns choques simultâneos, como a desvalorização cambial ocorrida desde o início do ano e o aumento do preço de commodities (especialmente agrícolas em decorrência de problemas no campo). Esses fatores levarão o IPCA para 3,1% nesse ano.
A normalização da safra mundial no próximo ano deverá dissipar o choque primário. Os mercados futuros sugerem redução da inflação de alimentação à frente, como mostra a Figura 4. No entanto, alguns bens e serviços serão reajustados pela inflação passada (inércia) em ambiente de recuperação da atividade, o que aumentará a inflação para 3,3% em 2021, ainda abaixo da meta do Banco Central em 3,75%.
Figura 4. Brasil: Aumento preço de commodities agrícolas está pressionando a inflação ao consumidor.
Fonte: Bloomberg e IBGE. Elaboração: Eduardo Yuki
A principal incerteza do cenário econômico está no ajuste fiscal. O governo está buscando alternativas para financiar um novo programa de transferência de renda. É louvável a preocupação com os desempregados, mas precisamos lembrar que o orçamento federal é finito.
O respeito ao teto de gastos implica que um novo gasto precisa ser financiado com corte de outra despesa. Se não respeitarmos a regra do jogo, haverá aumento do risco no país, desvalorização adicional da taxa de câmbio e aumento de juros. Isso tudo abortaria a nossa recuperação econômica.
Portanto, o processo de recuperação da atividade está ganhando vida própria com a melhora do mercado de trabalho e a expansão do crédito. A manutenção desse ambiente benigno exige a implementação de um processo de ajuste fiscal a partir do próximo ano.