A força do cooperativismo pode ser vista nos mais diversos momentos, especialmente nos de instabilidade. Para Renato Nobile, superintendente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), o modelo de gestão e governança faz com que, mesmo sofrendo os impactos das crises, as cooperativas sejam resilientes e se destaquem no mercado.
Como parte das comemorações do Dia C – Dia de Cooperar, 1º de julho, Dia Internacional do Cooperativismo, o CONEXÃO conversou com o executivo que há décadas levanta a bandeira do cooperativismo. Engenheiro e produtor rural, em 1988 associou-se à Cooperativa Agroindustrial Coopermota, localizada na cidade de Cândido Mota, no sudeste paulista. Na OCB desde 2008, em 2011 tornou-se superintendente da instituição.
Na entrevista, ele fala sobre o desenvolvimento das cooperativas no Brasil e os desafios para o crescimento desse modelo de negócio no país. Veja abaixo os destaques:
Para o Sr., o que de fato o cooperativismo representa para sociedade contemporânea?
O cooperativismo representa uma grande oportunidade. É a aplicação de uma relação construtiva e sustentável, conectando questões econômicas e sociais. A origem da cooperativa está no interesse comum, e os valores do cooperativismo resultam em um modelo de negócio mais adequado para a sociedade, um modelo que busca a melhoria econômica do grupo de cooperados, equidade social, geração e distribuição de renda.
É possível dizer que as cooperativas são mais resilientes em momentos de crise, quando a economia não vai bem?
Sim, porque as práticas de uma cooperativa, regidas pelos princípios do cooperativismo, são diferenciais que trazem maior resiliência para o negócio. Nos momentos de instabilidade econômica, crise política e de confiança, as cooperativas mostram seu diferencial. Foi assim na crise mundial de 2008, quando o setor cooperativista mostrou sua força absorvendo e mitigando seus efeitos negativos.
É claro que, nos momentos de adversidade, as cooperativas também são afetadas, mas o sistema de gestão de uma cooperativa permite enfrentar os momentos de instabilidade. Em muitos municípios brasileiros, a iniciativa privada não tem interesse de investir e o poder público também, e as cooperativas atendem às necessidades da população.
Qual o segredo do sucesso das cooperativas nacionais que obtiveram crescimento nos últimos anos, mesmo com a crise?
A gestão é um fator importantíssimo. Em qualquer atividade, as cooperativas devem estar inseridas no mercado de forma competitiva, o que as obriga a ter uma gestão profissionalizada e uma governança eficiente. A tecnologia, a inovação e a segmentação de produtos também permitiram o crescimento das cooperativas nos últimos anos.
Todo esse conjunto de fatores faz com que as cooperativas enfrentem as adversidades do mercado, mas esse é um desafio permanente. A profissionalização da gestão é um processo contínuo em todo o setor cooperativista.
Que áreas do cooperativismo no Brasil são exemplos para o mundo?
O cooperativismo brasileiro é muito robusto na agropecuária, crédito e saúde. O mundo vem ao nosso país conhecer as nossas boas práticas de governança e gestão. E também cito outras áreas mais tradicionais, como as cooperativas de transporte urbano, e outras mais recentes, como a de infraestrutura, com geração de energia de fontes renováveis.
Em um momento em que a sustentabilidade financeira ganha tanta importância, como fazer com que as cooperativas não se distanciem de sua vocação para o desenvolvimento sustentável? Como fazer com que as cooperativas continuem sólidas sem “deixar ninguém para trás”, como diz o tema do Dia de Cooperar?
É um desafio. Os dirigentes sempre devem ficar atentos para uma balança de equilíbrio no comando de uma cooperativa, e pensar no desenvolvimento do cooperado, já que a cooperativa não foi criada para ter lucro e sim em uma evolução dos cooperados e da comunidade que ela está inserida. A cooperativa tem que ter resultado financeiro positivo, mas sem esquecer seus objetivos principais, mantendo o equilíbrio das contas e investimentos. Isso é um enorme desafio para qualquer gestor.
Especificamente na área da saúde, qual o papel do cooperativismo no desenvolvimento sustentável?
O cooperativismo na área da saúde nos enche de orgulho, pois temos o maior sistema cooperativo de saúde do mundo. É um sistema fantástico e um braço de apoio ao sistema público de saúde do país. Estamos presentes em 85% do Brasil com serviços de saúde, sendo que 38% dos beneficiários dos convênios são clientes das cooperativas de saúde. Isso mostra a importância e o tamanho do setor cooperativista na área, mesmo com todas as dificuldades que um país com dimensões continentais e em desenvolvimento, como o Brasil, possui.
Por que no Brasil, em determinados setores, o cooperativismo tem menos expressividade? Ainda há certa resistência e até preconceito com o sistema cooperativista?
O desconhecimento do modelo cooperativista é um fato. O “incômodo” dos concorrentes também é uma realidade: quando entramos em um mercado, empresas com modelo de negócios tradicional ficam incomodadas. Há também certo desconhecimento do poder público sobre como funciona uma cooperativa.
Dentro do próprio mercado da saúde, nas áreas fiscal e tributária, a interpretação dos agentes de arrecadação às vezes induz a uma bitributação, taxando a cooperativa e o cooperado. Esse também é um gargalo que nós temos que resolver na legislação.
A comunicação também é um desafio permanente, seja a comunicação com o mercado, com a sociedade e com o próprio cooperado. Temos que deixar claro o modelo de governança de uma cooperativa. É uma batalha do dia a dia, um conjunto de elementos visando o desenvolvimento pleno das cooperativas e seus cooperados.
É gigantesco o trabalho que nós temos e só teremos êxito quanto mais unidos formos. Precisamos ter unidade nos sistemas organizados nacionais, harmonia e sinergia com os sistemas estaduais e singulares. Dessa forma, estimulamos o desenvolvimento do cooperativismo brasileiro.
E o que representa o Dia C para o cooperativismo brasileiro?
É um grande momento e que traz o engajamento das cooperativas em todo o Brasil. Nasceu em Minas Gerais, em 2009, para estimular a prática do voluntariado, e hoje se transformou nesse programa nacional em que incentivamos as boas práticas. É o dia de celebrar!

















