Se não for bem administrada, a Emergência aberta atrai pacientes ambulatoriais, aumentando a o tempo de espera por atendimento, insatisfação e erros.
Em todo o Brasil, os hospitais vivem o desafio de garantir resolutividade aos pacientes de urgência, priorizando os casos mais graves, mas sem perder de vista o atendimento em um tempo que pareça justo ao usuário.
“Infelizmente há pacientes que chegam no setor de Emergência mas possuem apenas sintomas leves e, por isso, acabam desfrutando do espaço de quem realmente precisa naquele momento”, explica o diretor médico do Hospital Unimed Recife III, Fernando Cruz.
A questão não é de agora. Vários fatores contribuíram para uma gradual transformação de hábitos de pacientes nos últimos 15 anos. Do ponto de vista do consumidor, as agendas dos consultórios estão sempre lotadas, há esperas infindáveis e todos buscam mais agilidade sem grandes deslocamentos pela cidade. Assim, os pacientes passaram a procurar as unidades de emergência dos hospitais também para queixas de menor urgência. Essa transformação ocorreu no mesmo momento em que a medicina diagnóstica se aparelhou, criando emergências particulares capazes de diagnósticos mais rápidos e com radiologistas de plantão.
Os pacientes passaram a sair das emergências examinados, com seus exames realizados e já com orientação terapêutica, no que passou a se chamar de Emergencia Resolutiva. Houve, portanto, uma transição progressiva de um sistema de médicos particulares que, de seus consultórios, solicitavam exames complementares aos pacientes que deveriam regressar com os resultados para, só então, receberem a prescrição médica por um “one stop shop” em que em apenas uma ida à emergência tudo estaria resolvido.
Se, no modelo antigo, a atividade de atendimento de emergência era prioritariamente ocupada pelos casos mais graves, hoje, 80% provém de pacientes que aproveitam horários de sua melhor conveniência como os do final da tarde. É um fluxo difícil de administrar. Na cabeça do paciente que chegou primeiro, o correto é ser atendido antes. Entretanto, os processos de triagem da instituição é que irão determinar o tempo de espera.
“O paciente de menor gravidade irá ficar esperando duas, três horas para ser atendido porque conforme o tempo corre outros com casos mais urgentes passam na frente dele”, diz Cruz.
Para complicar mais, ainda há aqueles casos típicos de segunda ou sexta-feira. Na tentativa de “ganhar” um atestado médico, algumas demandas simulam ou fingem doenças para faltar ao trabalho. “Segunda-feira é o pior dia porque já é conhecido no meio médico como o clássico jeitinho para descansar após um final de semana cheio”, conta Cruz.
Esse fator só contribui para que o tempo de espera nestes dias seja ainda pior. Como consequência de tudo isso, a Emergência operando acima da capacidade pode resultar em menos segurança assistencial, incluindo erro de diagnóstico. Isso pode ocorrer porque a lotação de pacientes pressiona os profissionais a serem mais ágeis e, com isso, decisões podem ser tomadas às pressas.
Triagem adequada e melhoria de processo
Alguns hospitais optaram por métodos que vão além dos mais tradicionais protocolos, como o de Manchester ou o Canadian Triage and Acuity Scale, na tentativa de sanar esse problema. “Com 20 mil atendimentos por mês, nos vimos obrigados ou a selecionar o público que seria atendido ou manter o acesso, mas mudando a forma de trabalhar”, explica o diretor da Rede D’Or, Rodrigo Gavina em entrevista à revista Melhores Práticas em Saúde, Qualidade e Acreditação.
No sistema implantado pela Rede, conhecido como Smart Track, o paciente abre a ficha ao chegar e em seguida vai a uma espécie de box individualizado. Ali, recebe o primeiro atendimento, sem precisar passar pelo tradicional sistema de triagem. “Deixa-se de lado o conceito de consultório e passa a se trabalhar com áreas de atendimento individualizado. Anteriormente, tínhamos um índice de 10% de desistência de pacientes devido à espera, que foi completamente eliminado”, enfatiza Gavina.
Em casos extremos, como em situações de surtos de doenças, Cruz, do Hospital Unimed Recife III, relembra que a gestão de fluxo na emergência requer ações diferenciadas. “Quando tivemos o surto da dengue recentemente tanto a Emergência quanto os ambulatórios estavam lotados de pessoas procurando atendimento. Em nosso hospital costumamos usar a estratégia de alocar mais clínicos nos ambulatórios para os momentos de pico”, diz.
Conscientizar o paciente ajuda a minimizar o problema
No que se refere à educação do paciente, existem alternativas para ajudar a desmistificar o problema de o paciente confundir que Emergência é igual a atendimento ambulatorial. Conheça algumas medidas que a instituição pode tomar para conscientizar o paciente sobre o tema:
- Caso o hospital utilize um sistema de protocolo, como o de Manchester, deixe em locais de fácil visualização o que significa cada cor, e o que isso interfere na ordem de prioridade no atendimento.
- Espalhe cartazes ou flyers nas recepções e salas de atendimento para divulgar essa informação também entre o público interno. Instruir seguranças e profissionais administrativos sobre como orientar pode ajudar a minimizar o problema;
- Trabalhe em conjunto com a Comunicação ou Assessoria de Imprensa do hospital para disparar conteúdos para que esse assunto seja divulgado na mídia regularmente;
- Reúna-se com as equipes médicas e instrua os profissionais a esclarecerem durante o atendimento as diferenças entre os serviços de urgência, emergência e atendimentos ambulatoriais;
- Utilize as mídias sociais e o e-mail marketing para informar a data base de pacientes cadastrados no hospital sobre o que é Emergência e quais são os atendimentos prioritários neste setor;
- Durante a triagem explicar ao paciente a gravidade de sua doença e o que isso implica no tempo de espera também pode ajudar a fazê-lo não procurar o setor de Emergência por qualquer motivo.
- Reavalie o processo de triagem e atendimento do seu hospital. Se for necessário, mude estratégias e realoque mais profissionais para agilizar o atendimento médico.